Entenda a mudança no financiamento da Caixa Econômica Federal
A Caixa Econômica Federal divulgou em outubro algumas mudanças nas regras do financiamento imobiliário, como o teto do valor total do imóvel que pode ser financiado, o aumento da porcentagem do valor do imóvel que pode ser financiada e a limitação de apenas um financiamento ativo por cliente. Confira na íntegra as novas regras do financiamento da Caixa em 2024 e os impactos previstos no mercado imobiliário.
Nos últimos dias, a Caixa anunciou que vai alterar as regras do financiamento na modalidade do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo (SBPE), impactando tanto o valor total que pode ser financiado, quanto o teto do preço dos imóveis elegíveis.
Essas mudanças afetam as modalidades do Sistema Financeiro de Habitação (SFH) e do Sistema Financeiro Imobiliário (SFI), amplamente utilizados no país.
Com o banco sendo responsável por aproximadamente 60% dos financiamentos imobiliários no Brasil em 2024, conforme o informativo mensal da Associação Brasileira das Entidades de Crédito Imobiliário e Poupança (Abecip) de setembro/24, as alterações podem trazer consequências significativas para o mercado imobiliário como um todo.
Neste conteúdo, vou detalhar as novas diretrizes e explicar o que elas significam na prática para você que deseja financiar pela Caixa. Também trouxe opiniões de especialistas sobre qual a expectativa disso para o mercado imobiliário, ajudando a entender qual poderá ser o impacto na compra de imóveis nos próximos meses.
As novas regras para o financiamento imobiliário na Caixa em 2024
As mudanças das regras do financiamento imobiliário na Caixa podem ser divididas em três eixos:
- o teto do valor do imóvel que pode ser financiado;
- o valor de entrada do financiamento (por consequência na alteração do montante total) e
- o limite da quantidade de financiamentos ativos por clientes.
Valor do imóvel que pode ser financiado diminui
Em primeiro lugar, a nova regra impõe um limite no valor de compra do imóvel de até R$ 1,5 milhão para financiamentos da modalidade SBPE, ou seja, financiamentos que utilizando recursos da poupança e que, em geral, possuem taxas menores.
Antes dessa alteração, não havia um valor máximo para financiamentos através do SBPE – somente na modalidade SFH havia o teto de R$ 1,5 milhão. Porém, agora, a regra se aplica também para a modalidade SFI na Caixa Econômica Federal (CEF).
Porcentagem do valor do imóvel financiado menor e entrada maior
Outra alteração realizada no crédito imobiliário do banco foi a redução nas cotas de financiamento do imóvel.
No caso do Sistema de Amortização Constante - ou SAC - (em que o valor das parcelas vai diminuindo ao longo do período de amortização), o teto passa a ser de 70% do total do imóvel. No modelo anterior, a Caixa financiava até 80% da residência.
Para aqueles que escolhem a modalidade de amortização pela tabela Price (em que o valor das parcelas permanece constante no período de amortização) o limite é de 50% do imóvel – que antes era de 70%.
Efetivamente, o impacto dessa alteração no limite do montante financiado é o aumento do valor de entrada, conforme a modalidade de amortização:
- Pela tabela SAC, o comprador precisará desembolsar 30% do valor do imóvel como entrada. Antes, essa quantia era de 20%.
- Pela tabela Price, o montante de entrada será de 50% do preço do imóvel. Previamente, era de 30%.
Abaixo, os gráficos mostram como ficam os montantes de entrada e financiamento para um imóvel de R$ 1 milhão antes e depois das novas regras de financiamento na CEF, para tabelas SAC e Price:
Limite de um financiamento por cliente
Outra mudança importante é a limitação a apenas um financiamento ativo por cliente. Até recentemente, era possível ter um financiamento pelo SFH e outro pelo SFI, ou mais financiamentos pelo SFI, desde que respeitado o limite de renda do comprador.
Agora, quem já possui um financiamento ativo com a Caixa não poderá contratar um segundo financiamento, mesmo que o imóvel se enquadre nos padrões das normas vigentes.
Confira todas as mudanças na tabela:
Regras | ANTES | NOVA REGRA |
---|---|---|
Limite de valor do imóvel | Haviam duas linhas de financiamento na Caixa, uma para imóveis abaixo de R$ 1,5 mi (SFH) e outra para imóveis acima de R$ 1,5 mi (SFI). | Imóveis residenciais acima de R$ 1,5 mi não serão mais financiados. O SFI estará restrito a imóveis comerciais. |
Valor financiado pela instituição | SAC: Caixa financiava até 80% do valor do imóvel Tabela Price: Caixa financiava até 70% do valor do imóvel | SAC: Caixa financia até 70% do valor do imóvel Tabela Price: Caixa financia até 50% do valor do imóvel |
Aumento do valor de entrada mínima | SAC: 20% do valor do imóvel como entrada Tabela Price: 30% do valor do imóvel como entrada | SAC: 30% do valor do imóvel como entrada Tabela Price: 50% do valor do imóvel como entrada |
Apenas 1 financiamento por cliente | Se havia um financiamento ativo pelo SFH, o outro poderia ser realizado pelo SFI, ou mais de um pelo SFI, desde que dentro do limite de renda do comprador. | Quem já tiver um financiamento ativo com a Caixa não pode fazer um segundo financiamento, mesmo que o imóvel esteja nos padrões da norma atual. |
O que motivou essas mudanças?
É importante salientar que a Caixa Econômica Federal não divulgou oficialmente o que motivou a mudança das regras do financiamento.
No entanto, de acordo com Ronal Balena, especialista no mercado imobiliário, e Paulo Prado, profissional com mais de 25 anos de experiência em crédito imobiliário, essas mudanças parecem estar relacionadas à redução dos depósitos na poupança, a principal fonte de recursos para o crédito imobiliário.
Um problema que se especula é um volume de depósitos na poupança muito baixo em relação ao saques. [...] A principal origem do dinheiro do crédito imobiliário é a poupança, e, se você tem um número de saques maior do que o número de entradas, isso complica também o dinheiro disponível.
- Paulo Prado
Com a alta da taxa SELIC, que vem crescendo desde 2021, atingindo em setembro de 2024 o patamar de 10,75% a.a., muitos investidores optaram por retirar seus fundos da poupança, buscando aplicações financeiras mais lucrativas – como o Tesouro Direto e outros tipos de investimento. Isso resultou, provavelmente, em menos recurso disponível no SBPE para empréstimos imobiliários.
No informativo mensal da Abecip, referente a agosto/24, fica evidente que os saques na poupança superam os depósitos, como mostra o gráfico abaixo.
A captação líquida da poupança – ou seja, o saldo final entre o que os valores aplicados e sacados – tem apresentado resultados negativos em vários meses desde 2021.
Assim, com menos dinheiro entrando na poupança, a consequência esperada é que os bancos, incluindo a Caixa, tenham que ajustar suas regras de financiamento.
Ronal Balena afirma que, como a demanda por financiamentos segue alta, sobretudo via Minha Casa Minha Vida (MCMV), a instituição adotou essas medidas para diminuir o volume de crédito concedido, elevando o valor de entrada e reduzindo o percentual do imóvel que pode ser financiado.
Essas mudanças buscam garantir que o banco consiga continuar oferecendo crédito imobiliário, mesmo com a queda de receitas provenientes da poupança.
O que isso significa para o mercado imobiliário?
A expectativa é que as recentes mudanças nas regras de financiamento da Caixa terão um impacto significativo no mercado imobiliário.
Com o banco sendo responsável por mais de dois terços do setor de crédito imobiliário no Brasil, essas alterações irão provocar uma restrição no recurso disponível, afetando diretamente o volume de vendas – é o que explica o especialista Ronal Balena:
Como a Caixa é o principal player do setor, tudo o que eles fazem impacta o mercado imobiliário. [Os bancos terão que buscar] [...] medidas como emissão de LCI, que são as letras de crédito imobiliário, que é uma outra forma de captar recursos para para financiar o crédito imobiliário [...] então o que que eu acredito que vai acontecer em geral, não é que vai secar o crédito, mas é que estruturalmente você vai ser obrigado a captar dinheiro de outras fontes que são mais caras do que a poupança para emprestar para créditos imobiliários, com juros mais altos. É claro que a Caixa sendo mais restritiva, o que acontece é que o mercado esfria.
- Ronal Balena
Paulo Prado, especialista em crédito imobiliário, reforça essa opinião, colocando que dificilmente os demais bancos conseguirão suprir o gap deixado pela Caixa, uma vez que enfrentam cenários semelhantes de restrição orçamentária e dependência dos recursos da poupança.
Você tem menos crédito disponível, você vai ter um mercado menos aquecido, vai ter menos venda. Os outros bancos não vão suprir esse gap da caixa, não haverá uma movimentação nos outros bancos para aumentar o volume de crédito, pelo menos acho pouco provável principalmente no final do ano. Os outros bancos também têm questões orçamentárias envolvidas, eles têm o mesmo cenário da Caixa.
- Paulo Prado
A médio prazo, ambos especialistas mencionam a necessidade de novas ferramentas financeiras para o crédito imobiliário, que poderiam aliviar a dependência da poupança. No entanto, Ronal e Paulo são céticos quanto a mudanças imediatas, acreditando que essas soluções levarão tempo para serem implementadas e reguladas pelo Banco Central.
Quando essas regras passam a valer?
O início das novas regras de financiamento da Caixa está previsto para o dia 1º de novembro de 2024.
Já tenho um contrato de financiamento em vigor, vai mudar?
Não se preocupe. As mudanças, que entrarão em vigor dia 1º de novembro, não serão aplicadas aos financiamentos já ativos.
Ainda, os imóveis adjudicados (recuperados pela Caixa) também não estão sujeitos às novas regras.
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